Em carta publicada pelo site The Players’ Tribune, nessa sexta-feira (10), o goleiroCássio refletiu sobre ensinamentos ao longo de sua carreira e relembrou sua fase pré-Corinthians, quando apenas almejava ser um bom jogador. Nela, ele se diz com sede de mais conquistas com a camisa alvinegra. Confira trechos a seguir.
“Às vezes, a gente não entende direito os planos de Deus”, diz Cássio já no início da missiva, ao repassar sua carreira, que começou em sua cidade natal, Veranópolis, no time homônimo, mas fora das quatro linhas: ele foi mascote por um tempo, conforme relata.
Lá, assim que foi crescendo, ele ia jogar a peleja com garotos da mesma idade e acabou sendo conduzido para o gol, por conta de sua altura, que já começava a destacá-lo na época:
— Quem me levava na época era o meu tio, João Carlos, o Kojac. Ele era massagista do clube quando o Veranópolis estava na segunda divisão, no início dos anos 1990. E o técnico do time era o Tite… Vinte anos antes de nos encontrarmos no Corinthians, nós tínhamos conhecidos em comum lá no Sul. E eu até jogava, mas as coisas mudaram de patamar depois de uma experiência… Diferente, digamos. Um dia, meu tio, que treinava um time amador de futsal, me levou para um dos treinamentos. O goleiro teve de ir embora. Todo mundo olhou pra mim e daí vocês já sabem: “Vai, Cássio, entra lá.” — disse o defensor da meta corintiana em trecho da carta, já relatando o primeiro contato com Tite, com quem foi campeão Mundial em 2012, anos depois.
Cássio começou a treinar com rapazes mais velhos nesta fase, e descobriu que não tinha medo de ficar no gol, percebendo ali, conforme relatou, que faria sua história no futebol ocupando a meta.
Foi aí que começou a estudar outros goleiros, como Gilmar Dal Pozzo, que defendia o Veranópolis na época. Uma outra referência citada por Cássio na carta publicada é o ex-futebolista que acabou se tornando político Danrlei — quem ele conheceu quando já estava no Grêmio, clube que passou a defender com 12~13 anos de idade.
— E foi nessa época que surgiu uma oportunidade que poderia fazer meu sonho se tornar realidade. Eu saí da minha Veranópolis e fui pra Porto Alegre – para ser jogador das categorias de base do Grêmio. Da minha cidade, onde as pessoas dormiam de porta destrancada, para a capital, onde cheguei a me hospedar nas dependências do clube, que ficavam no estádio Olímpico. Eu sentia falta da minha mãe e dos meus irmãos, ainda que tivesse sido bem acolhido pelos meus familiares em Porto Alegre. Quando estava sozinho, eu chorava muito. E talvez meu destino fosse outro não fosse a chance que tive de conversar com um dos meus ídolos, o Danrlei. É difícil falar do que poderia ter sido, mas aqueles cinco minutos fizeram uma diferença enorme para mim. Aquela conversa foi fundamental. Me encheu de ânimo e fez com que eu me dedicasse para ser um goleiro como ele foi, vitorioso e campeão. Só que, ao contrário dele, a minha história não seria no Grêmio.
Um tempo fora até chegar ao Corinthians
Cássio começou a se destacar para além do sul brasileiro, no Grêmio, ao integrar a Seleção Sub-20 em disputa do Sul-Americano, que garantiu vaga do Brasil nos Jogos de Pequim. Pouco tempo depois ele passou a ser sondado enquanto seguia no Tricolor do sul, e foi, dessa forma, para o futebol holandês, jogar pelo PSV. Na Holanda ainda jogou pelo Sparta Roterdã.
Da Holanda para o Corinthians
“A minha passagem pelo futebol holandês terminava, e uma porta estava se abrindo para mim no Brasil”, conta, se referindo à sua chegada ao Corinthians, e num trecho emocionante, relata a oportunidade dada por Tite, quem comandava o elenco que ganhou o mundo em 2012:
— Você sabe por que estou te colocando de titular? — perguntou Tite, segundo seu relato. — Não sei, professor. — respondeu Cássio. — “Muitas vezes, eu não estava aqui vendo o treino, e você mantinha o mesmo nível de dedicação. Em outras ocasiões, eu estava com os não relacionados e você continuava treinando firme. Este é um aprendizado que você tem que levar pra vida, guri. Mesmo quando você acha que ninguém está vendo, tem sempre alguém te olhando”, teria lhe dito o treinador.
Aprendizados do goleiro
Ele relata que “se tem uma coisa que eu aprendi nessas 10 temporadas de Corinthians é que nós temos de saber quem somos. Então, não podemos achar que somos os melhores do mundo quando vem o elogio. E nem podemos acreditar que somos os piores quando recebemos críticas”, e se refere, logo em seguida, à temporada 2016, ano em que acabou perdendo a posição de goleiro titular, por conta do desempenho insatisfatório.
Sobre esse período, ele relata que aprendeu a se autoavaliar com a ajuda de colegas, amigos e profissionais pacientes, e se converteu ao evangelho, de forma que tem conseguido ter mais foco e disciplina com seus próprios objetivos:
— Assim como a vida, o futebol é feito de escolhas. Em 2017, me converti ao Evangelho e, desde então, não tomo mais nada de bebida alcoólica. Passei a ter uma vida regrada, totalmente dedicada ao trabalho e à minha família. O Corinthians me mostra a cada dia que, para permanecer em alto nível, tenho de seguir me preparando e me dedicando ao máximo, com a mesma vontade do meu início de carreira. E ser uma referência não apenas dentro de campo. Os jogadores mais jovens e até mesmo as crianças olham para mim. E eu aceito essa responsabilidade. O ano de 2017 foi muito marcante, não apenas por conta dessas minhas escolhas pessoais, mas porque pude ver como a Fiel acreditou numa equipe que ninguém botava fé.
O mundo e 10 temporadas não bastam
Refletindo sobre sua trajetória no Corinthians e tudo o que viveu, Cássio crava que ainda quer mais: “Jogar no Corinthians é a realização de um sonho. Um sonho que eu acreditei tanto, que, depois de tudo que conquistamos juntos, só posso ser grato. Aos meus companheiros, aos funcionários, ao clube e, principalmente, a você, Fiel torcida. Se estou satisfeito? Não, porque, se tem algo que agora eu entendo perfeitamente, é que podemos conquistar muito mais. Basta não colocarmos limites nos nossos sonhos”, conclui.