O pequeno Ramon Júnior, de quase três anos, tirava o fone de ouvido do pai a cada pergunta. Ele também deu um ‘Oi’ tímido à reportagem depois de alguns segundos. É que o menino ainda não sabia expressar em palavras o que era dito pelo pai dele, também Ramon, ao mesmo tempo. Ex-jogador do Fluminense, o atacante, de 23 anos, estava de volta ao Brasil após viver boa parte da pandemia no Japão.
- Torcida do Fluminense quer demissão de Mano
- Thiago Silva 'aposenta' após erro bizarro em Fluminense x Fortaleza
“Posso dizer que fiquei sozinho por tempo demais”, lembrou ele em entrevista exclusiva ao Bolavip Brasil. “Em 2020, por conta da covid, eu fiquei sozinho lá no Japão. Todo mundo já tinha passagem comprada, mas as fronteiras fecharam e ninguém estava liberado. Fiquei um ano e meio praticamente sozinho, me virando. Foi bem complicado porque, querendo ou não, eu estava num país totalmente diferente. Era difícil até de me comunicar lá e os horários não ajudavam a falar aqui no Brasil”, analisou.
Antes da transferência para a Ásia, Ramon só jogou em dois clubes do Brasil. Foram 15 anos no Fluminense, que o formou e profissionalizou, e um breve período no CSA, de Alagoas. Pelo desejo de amadurecer como homem e como atleta, o atacante decidiu que deveria sair definitivamente das categorias de base para o profissional. Após um período de empréstimo, o Ryukyu decidiu comprá-lo.
O Fluminense vai se destacar na Libertadores 2022?
O Fluminense vai se destacar na Libertadores 2022?
0 PESSOAS JÁ VOTARAM
“Não posso me martirizar e ver o lado ruim da coisa. Eu amadureci muito mais. Cozinhei, limpei casa, fiz compra. O que não sabia da língua, ia gesticulando, às vezes não entendiam, mas tinha que arriscar (risos). Na base, ainda há aquele jeito de garoto, por mais que eu fosse responsável. Eu queria dar a vida pelo futebol de verdade, como venho fazendo agora”, contou.
Bem-humorado, Ramon é cheio de histórias para contar. Se tornou ávido por comida japonesa, ao contrário de sua esposa, Chrislaine, que sabe fazer, mas não gosta. Cria do Rio de Janeiro, ele sentiu os problemas de não falar japonês no começo, mas a hospitalidade do país o surpreendeu — claro que, como todo jogador que sai do país sem falar a língua, ele passou por alguns perrengues.
“Uma vez precisei ir para os correios e o auxiliar efetivo do time, brasileiro, me ajudava a fazer algumas coisas e a compreender a língua. Nesse dia, eu tive que ir sem ele, cheguei lá e tive que fazer a mímica mesmo. Não conseguia falar nada, pô. Foi um momento que eu fiquei: ‘Velho, não consigo me comunicar’ (risos). Logo nas primeiras semanas, passei por algo assim. Eu pedia comida nos restaurantes, errava as palavras e o garçom já vinha rindo. Mas é irado passar por isso.”
A distância entre o Rio de Janeiro e a ilha de Okinawa, onde vive Ramon, é de mais de 19 mil quilômetros. O fuso horário, nem se fala — são 12 horas à frente no país asiático. É dia no Brasil, madrugada no Japão. Passar pela pandemia a quase dois dias de viagem de avião complicava Ramon e lhe dava vontade de voltar. Quando seu pai, Sidnei, e a mãe, Cristina, foram diagnosticados com covid, então…
“Eles dois pegaram covid, mas ninguém me contava como eles estavam, a gravidade. Meu pai sempre foi um cara forte, grande, e eu vi ele por chamada de vídeo super magro. Juntei as coisas em casa mesmo e falei: ‘Vou voltar pra casa’. Foi o momento em que eu mais pensei em voltar para o Brasil. Eu estava bem, mas quando soube que ele estava mal… Não tem dinheiro, nada, que troque isso. Se fosse o último momento do meu pai, eu jamais me perdoaria por estar longe, apesar de estar vivendo o nosso sonho”, revelou.
Por conta de tudo isso, Ramon está de olho na próxima janela de transferências. Ele e seus empresários monitoram o cenário nacional e internacional. Por conta da família, ele diz que prioriza uma transferência que o coloque de volta ao país, embora não descarte um movimento para Europa ou até para a própria Ásia.
“Eu gostaria de ficar aqui no Brasil por um tempinho, sim. Tenho muito tempo de futebol pela frente, passei esse momento todo sozinho, longe do meu filho, da minha família. Acho que seria ideal para mim, para me sentir bem e com alegria, voltar aqui para o Brasil. Foi difícil ficar só por chamada de vídeo. Meu filho dizia: ‘Papai, quero te ver, quero te ver’, e eu não podia atender esse pedido dele. Dá aquele aperto no peito. Por isso, estando com eles, sei que vou render ainda mais do que já vinha conseguindo”, garantiu.
Questionado mais de uma vez sobre as propostas que já tem na mesa, Ramon preferiu sair com bom-humor. Ele admitiu que tem algumas e que analisa com carinho as sondagens, mas que não pode dar detalhes.
“Pô, vou ter que guardar essa informação. Estamos estudando as possibilidades todas direitinho, com muito cuidado e levando em consideração todo o planejamento. Já tenho algumas sondagens, mas não posso te falar os nomes, né? (risos). Tem uns quatro times aí de olho, mas vou parar por aqui. Eu quero esse momento com a minha família, curtir os meus amigos de novo, essas festas. Estou precisando”, disse.
Ramon surgiu no Fluminense aos cinco anos de idade. Ele jogava numa escolinha do Flamengo, mas não era federado pelo clube. Por conta do talento, um amigo de seu pai disse que ele deveria levá-lo ao tricolor — e bastou um treino para que vissem que aquele menino pequeno e canhoto pertencia ali. Além de tudo, ele ainda é primo do lateral-esquerdo Marcelo, também revelado pela equipe.
“Eu tenho uma gratidão muito grande à instituição Fluminense. Eles me formaram, fizeram de mim um jogador profissional. Foram 15 anos lá dentro, sempre batalhando, sempre tendo condições de batalhar também. Passamos por coisas boas, ruins, alegrias e tristezas. É impossível eu chegar aqui e dizer a você que não penso em devolver ao clube tudo o que fizeram por mim.”